Narendra Murkumbi, o primeiro indiano a investir no setor de acar e lcool no Brasil, comeou a fazer aulas de portugus. Uma vez por semana, ele d uma pausa em reunies e em seus afazeres no escritrio da Shree Renuka Sugars, em Mumbai, e se rene com uma professora vinda de Goa, um pequeno Estado no oeste da ndia que, devido aos 400 anos de colonizao portuguesa, ainda mantm o idioma - com algumas modificaes - tambm falado no Brasil.
O interesse por aprender a nova lngua bvio. O Brasil se tornou a maior plataforma de produo de acar bruto da Shree Renuka, em menos de dois anos. Das cerca de 20 milhes de toneladas de cana-de-acar que a empresa processa entre Brasil e ndia, 13,6 milhes esto em terras brasileiras - nmero que vai atingir 15 milhes em um ano.
Com 40 anos, Murkumbi um dos homens mais influentes do setor canavieiro indiano e, no Brasil, sua empresa tambm figura entre as principais do pas. Na ndia, est na lista dos novos bilionrios, segundo a revista Businessworld. Mas apesar da posio, Murkumbi um homem de poucas cerimnias.”"Sou um bilionrio, mas em rpia”, brinca o executivo sobre a desvalorizada moeda local - US$1 equivale a 45 rpias. Em seu escritrio, decorado com simplicidade, ele conta que se surpreendeu com os primeiros resultados do negcio de acar, lcool e energia no Brasil.
Este ser o primeiro exerccio de 12 meses das duas usinas paranaenses do Vale do Iva, as primeiras adquiridas pelo Renuka. E o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciao e amortizao) j atingiu 25%, mesmo com uma moagem reduzida. A capacidade no Paran, conta ele, de 3,1 milhes de toneladas, mas foram processadas apenas 1,5 milho de toneladas por causa da seca que atingiu os canaviais da regio Centro-Sul do Brasil no ano ado.
Ele pondera que no possvel comparar diretamente o desempenho brasileiro com o das unidades indianas, que devem registrar Ebtida da ordem de 15% a 20%. “So bem menos intensivas de capital, pois no tm plantio de cana - o governo no permite s indstrias cultivarem a matria-prima”.
Mas o fato que bons exemplos brasileiros esto sendo replicados no pas asitico. Entre eles os de produo de energia eltrica com bagao de cana em maior escala.
H dois anos Shree Renuka comeou a fazer parcerias com usinas que tm bagao disponvel, mas no dispem de capital para investir em uma unidade de cogerao. A empresa entra com o maquinrio - por meio de sua empresa de equipamentos industriais KBK Chem-Engineering - e a unidade parceira, com o bagao. Da energia total produzida, a usina fica com o volume necessrio para sua autossuficincia e o excedente, com a Shree Renuka.
Nesses dois anos a empresa j conseguiu arrebanhar usinas que geram excedente de 54 Megawatts (MW). O nmero representa em torno de metade do total de energia excedente que a companhia produz na ndia - 111 MW. No Brasil, so mais 139 MW nas quatro usinas. “Estamos em negociao com outros grupos indianos que juntos podem adicionar a essa energia excedente mais 200 MW a 300 MW”, afirma o executivo.
Murkumbi tambm mobilizou usinas da ndia para propor ao governo a criao de um conselho para definir preos da cana nos moldes do “Consecana” no Brasil. O objetivo remunerar o fornecedor de cana de acordo com os preos de acar e do lcool.
Na ndia, o governo define o valor mnimo a ser pago pela cana no pas, nem sempre levando em conta a realidade de preos dos dois produtos finais, diz Murkumbi. “O projeto j foi entregue ao governo e esperamos uma deciso para o prximo ano”.
Os bons exemplos tambm fazem o caminho inverso. Do ponto de vista industrial, as usinas da ndia so bem avanadas, com elevada automao. Em alguns casos, a ndia se destaca. o caso da tecnologia usada na concentrao de vinhaa, que no Brasil um resduo do processo industrial (que pode ser poluente se jogado em rios), mas que na ndia, usado para produzir etanol, a partir da mistura com o melao.
Com o uso de um fermento especial, os indianos produzem para cada 1 litro de etanol apenas trs litros de vinhaa, ante os cerca de 12 litros fabricados no Brasil. O desenvolvimento dessa tecnologia se fez necessria no pas asitico porque l, diferentemente do Brasil, a vinhaa no pode ser usada para irrigar as reas de cana, pois as usinas no detm reas cultivadas.
Algumas empresas indianas de equipamentos para usinas comeam a olhar com mais interesse o mercado brasileiro, que hoje tem na Dedini Indstria de Base, sua maior companhia. A KBK Chem, subsidiria da Shree Renuka, est dando e no projeto de desidratao de etanol na unidade da Vale do Iva, no Paran. “A KBK est olhando alguns projetos de desidratao de lcool no Brasil. No entanto, atualmente no h planos para a instalar uma unidade no Brasil”, afirma Murkumbi.
Fonte: Valor Econmico. Por Fabiana Batista. 25 de fevereiro de 2011.