Em meio a uma nova disputa por terras na regio de fronteira com o Brasil, o ministro do Interior do Paraguai, Carlos Filizzola, disse que os fazendeiros brasileiros que tiverem ttulos "ilegais" podero perder suas propriedades no pas.
"Aqueles que no tiverem como comprovar sua legalidade, devem estar preocupados. Os que tm ttulos legais podem ficar tranquilos", disse em entrevista BBC Brasil, falando de Assuno.
"Os que receberam terra de forma ilegal podem se preocupar. Sejam paraguaios, brasileiros ou de outra nacionalidade", completou.
O ministro afirmou que as terras devero ser restitudas ao Estado, mas disse que caber Justia a definio sobre a veracidade e a legalidade dos documentos, dizendo que Poder Judicirio do pas " muito lento, mas deve ser respeitado".
Suas declaraes foram feitas no momento em que grupos de sem terras ocupam propriedades nos municpios na regio do Alto Paran, no leste do pas.
Advogados dos fazendeiros dizem que as invases comearam em abril de 2011, mas que teriam se intensificado este ano, principalmente no municpio de acunday, onde esto as terras do brasileiro naturalizado paraguaio Tranquilo Favero, chamado pela imprensa local de "rei da soja" do Paraguai.
"Setores do governo no atendem s determinaes judiciais de que a polcia deve desocupar os terrenos", disse BBC Brasil o advogado Guillermo Duarte, defensor de Favero.
"Ele tem terras produtivas h mais de quarenta anos e deve ser respeitado pelos investimentos que fez e faz no pas."
Flilizzola, no entanto, afirmou que o governo tem atendido a todas as determinaes da Justia para as desocupaes das terras. Em um dos casos, em um pedao de terra prximo a uma empresa, a desocupao no foi realizada porque a Justia no teria emitido parecer especfico.
"At o momento no recebemos nada da Justia", afirmou o ministro. Estas terras tambm seriam de propriedade de Favero, de acordo com seu advogado.
Nos ltimos dias, emissoras locais de televiso e fotgrafos registraram o que seriam grupos de sem terras com foices e paus defendendo sua permanncia nas reas ocupadas.
Um dos lderes do protesto, Victoriano Lpez, disse BBC Brasil que "mais de 10 mil famlias estariam acampadas em uma extenso de 7 quilmetros", onde esto as instalaes de uma empresa de eletricidade.
"Essa aqui terra pblica. Os brasileiros esto ocupando terras fiscais que deveriam ser do povo paraguaio. Ns somos pobres e eles esto ricos."
Lpez disse que os sem terra "no tem apoio do governo" e que a polcia "que deveria proteger o povo paraguaio, est do lado dos latifndios". Ele afirmou que no h planos de liberao das terras ocupadas em acunday.
Problema estrutural
Segundo o ministro do Interior paraguaio, a distribuio de terra hoje um dos grandes problemas do pas, que tem 6,4 milhes habitantes, com cerca de 35% de pobres. Oitenta por cento das terras esto "nas mos de apenas 2%" da populao, afirma Filizzola.
"No Paraguai, grande parte das terras est nas mos de poucos. Os grandes latifndios surgiram principalmente durante a ditadura de (Alfredo) Stroessner, quando as terras foram entregues ou vendidas, mas sempre em meio a muita corrupo. E aquele sistema foi mantido pelos governos que sucederam o de Stroessner", afirmou.
Segundo ele, muitos brasileiros e paraguaios aram a ser donos de terras naquele perodo.
Na sua opinio, os conflitos de terras so recorrentes no pas porque o Paraguai "fundamentalmente agrcola" e o pequeno produtor no tem o terra, como deveria.
"Existe um problema antigo de concentrao de terras no pas e por isso necessitamos de uma reforma agrria integral. Com o governo (do presidente Fernando) Lugo adotamos vrias medidas, tentamos melhorar essa situao, mas esse um problema estrutural, que vem da poca de Stroessner e ainda h muito a ser feito", insistiu.
Radiografia
Filizzola disse que o governo pretende "deixar transparente" a radiografia das terras no territrio paraguaio.
O Instituto Nacional de Desenvolvimento Rural e da Terra (Indert), equivalente ao Incra no Brasil, est medindo as terras do pas. Depois disso, o governo pretende realizar um censo, com ajuda do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
Com posse dos dados tcnicos, Filizzola afirma que "o Poder Judicirio ter a palavra final" sobre as disputas entre fazendeiros e sem-terra.
Ele garante que a "propriedade privada" ser respeitada "desde que os documentos no sejam falsos".
No ms ado, fazendeiros reclamaram que os militares convocados para medir as terras na regio de fronteira teriam chegado acompanhados por grupos de sem terras.
Soja
O Paraguai o quarto maior produtor mundial de soja, mas o ministro observou que esta no a atividade que mais gera empregos diretos para os paraguaios.
"A soja muito importante, mas principalmente para exportao e exportada como matria-prima, gerando poucos empregos para os paraguaios. Devemos ter uma agroindstria e a sim sero gerados empregos no pas", disse.
Ele fez a mesma ressalva em relao produo de carne - outro setor com forte presena de produtores brasileiros no pas.
Nos bastidores do governo, autoridades costumam lembrar que o cultivo da soja
"levou o campons para a cidade, onde ele no encontra emprego, o que tambm contribui para o aumento da pobreza".
O ministro reconheceu que a pouco mais de um ano das eleies presidenciais, em abril de 2013, "difcil" que o governo Lugo, que no tem maioria no Congresso Nacional, aprove novas leis, como uma "ampla reforma agrria".
Fontes da embaixada do Brasil em Assuno disseram BBC Brasil, na semana ada, que estavam "otimistas" depois que o governo afirmou que respeitar a propriedade privada.
Fonte: BBC Brasil. Pela Redao. 13 de fevereiro de 2012.