O aproveitamento integral e racional de todos os recursos disponveis dentro da propriedade rural, com a introduo de novos componentes tecnolgicos, aumenta a estabilidade dos sistemas de produo existentes, bem como maximiza a eficincia dos mesmos, reduzindo custos e melhorando a produtividade. A associao dos diversos componentes em sistemas integrados, que preservem o meio ambiente, estabelece o princpio da reciclagem: "o resduo de um a a ser insumo de outro sistema produtivo".
Nas zonas rurais do Brasil, como conseqncia da criao de animais em confinamento e semiconfinamento, h uma grande produo de dejetos. Este resduo orgnico, conhecido como chorume, obtido da gua de lavagem de currais, pocilgas e granjas, sendo constitudo de fezes, urina, restos de raes e plos.
A quantidade estimada de produo de esterco de aves e sunos, que em geral so criados em regime de confinamento, de 93 milhes m3 (produo de 0,1 kg/dia/cabea) e 175 milhes m3 (utilizando mdia de produo de 15 litros/dia/cabea), respectivamente, por ano. Estes dados poderiam ser acrescidos da produo de pelo menos 180 milhes m3 de esterco lquido por ano do rebanho bovino, especialmente do leiteiro, que tem em torno de 21,5 milhes de vacas em lactao e secas (um animal que produz 6 mil litros de leite por ano gera aproximadamente 50 litros de esterco lquido por dia) e apresenta parte de sua produo em regime de confinamento.
Se fossem aplicados 10 m3 de esterco de aves e 60 m3 de esterco de sunos ou de bovinos por ha por ano, seria possvel aplicar estes produtos como fertilizantes em aproximadamente 15 milhes de hectares em um ano. Estes dados impressionam, mas considerando que ocorre perda de grande parte do dejeto produzido (rachaduras em esterqueiras, transporte, esterqueiras sem revestimento, entre outras), este potencial deixa de ser utilizado.
Desta forma, se no forem bem manejados e utilizados, os dejetos podem contribuir para a contaminao da gua de trs maneiras: a primeira, pelo escoamento superficial aps aplicao dos estercos no campo, lixiviao de nutrientes em funo de excessivas aplicaes, ou nos prprios tanques de armazenamento sem nenhum revestimento; a segunda, pela poluio do ar em funo de gases e odores liberados na decomposio do dejeto durante o perodo de armazenamento e/ou aps distribuio no campo; e a terceira, pela poluio do solo causada por aplicaes excessivas de certos nutrientes, tendo como conseqncia um desbalano em determinados elementos e que pode refletir negativamente no crescimento de plantas.
Da o chorume nos ltimos anos ter recebido bastante ateno por parte dos governos e da pesquisa. Tal interesse devido, por um lado, ao alto custo dos fertilizantes qumicos que limita o seu uso pelos agricultores familiares, e por outro lado, presso social por uma agricultura sustentvel, onde a reciclagem de nutrientes dentro da propriedade contribua no somente para a reduo dos custos, mas tambm para a reduo da poluio ambiental.
Alm disso, o uso de dejetos como fertilizante orgnico tem sido feito porque este contm uma srie de elementos qumicos prontamente disponveis (Tabela 1) que aps o processo de mineralizao estaro disponveis e podero ser absorvidos pelas plantas da mesma forma que aqueles oriundos de fertilizantes minerais industrializados.

Porm, ao contrrio dos fertilizantes minerais que possuem uma composio mnima definida para cada condio de cultura e/ou solo, a composio do dejeto extremamente desbalanceada em relao aos fertilizantes minerais, dependendo da alimentao fornecida aos animais, do manejo da gua e das condies de armazenamento, o que dificulta a recomendao de doses padronizadas, dificultando assim, a formao de grupos de fertilizantes orgnicos com um bom contedo de nutrientes, e assim, a prpria denominao do termo fertilizante para esse tipo de resduo questionvel.
Por isso, aplicaes contnuas podero ocasionar desequilbrios de nutrientes no solo e a gravidade do problema depender do tempo de aplicao, da composio e da quantidade de dejeto aplicado, alm do tipo de solo e da capacidade de extrao das plantas.
RESULTADOS DE PESQUISAS
A seguir descreveremos alguns resultados de pesquisas, realizadas nos ltimos anos, que atestam os resultados prticos da aplicao de esterco.
Veja na figura 1 o resultado da adubao de
Brachiaria brizantha cv. Marandu, (braquiaro) com doses crescentes de dejetos de sunos, em pesquisa realizada em Gois. Houve acrscimos de produo desde a menor dose, em comparao com a testemunha, sem adubao, atingindo incremento de 156% para a matria seca e 230% para a protena, na dose de 150 m3/ha. A dose de 100 m3 teve produo semelhante da adubao qumica.

Os resultados da adubao de 78 hectares de braquiaro com 180 m3/ha de dejetos de sunos, parcelados em seis aplicaes anuais, durante cinco anos, mostraram que, a partir do quarto ano, foi possvel manter uma lotao de 3,77 U.A. por hectare, em sistema de pastejo intensivo, no perodo de dezembro de 2001 a maio de 2002 (Figura 2).

Observaes realizadas em pastagens de capim tanznia, mombaa e braquiaro, fertirrigadas com dejetos de sunos, mostraram produes de at oito toneladas de matria seca por hectare por ms. Essas pastagens proporcionaram, em 1999, uma produo em torno de 1.899 kg de peso vivo por hectare, com uma lotao de 5,4 U.A./ha e um ganho em peso de 0,899 kg/animal/dia. No perodo anterior, (1998) a produo alcanou 1.508 kg de peso vivo por hectare (Figura 3). A economia de fertilizante qumico foi acima de 85%, em 1.200 hectares fertirrigados.

Como podemos verificar, os benefcios da adubao orgnica so muitos, principalmente em condies de clima tropical e subtropical predominantes nas regies de pecuria de leite e de corte, no Brasil, onde os solos so pobres e ocorre alta incidncia de radiao solar deteriorando a matria orgnica. Deste modo, o tratamento e a reciclagem dos dejetos (fezes e urina), alm de contribuir para reduo da poluio do meio ambiente e possibilitar reciclar nutrientes da alimentao animal para produo de biomassa, preservando e melhorando as propriedades fsicas, qumicas e biolgicas do solo, contribuindo assim para a manuteno de sistemas produtivos equilibrados. Alm disso, a utilizao de dejetos a a ser cada vez mais importante em funo da economia de fertilizantes qumicos derivados do petrleo, que so altamente energticos, caros e no renovveis.
Vale ressaltar que produzir de maneira sustentvel implica em reduzir custos de produo, e principalmente, evitar desperdcios de energia e de matrias-primas, aumentando a produtividade, a competitividade do capital e da mo de obra.
Na prxima edio trataremos de aspectos prticos da utilizao de esterco.

ricardo dias signoretti engenheiro agrnomo, doutor em produo animal, pesquisador cientfico/ apta colina-sp e consultor da coan consultoria.