por marcos s. jank
As exportaes brasileiras cresceram 9,3% ao ano desde 1996 e, nos ltimos cinco, anos essa taxa atingiu 21% ao ano. O bom desempenho recente deriva do forte crescimento da demanda mundial, da taxa de cmbio desvalorizada at o ano ado e do baixo crescimento interno, que estimulou as empresas a buscarem oportunidades l fora.
O boom recente das exportaes tem motivado a produo de estudos que procuram analisar o impacto dos preos e das quantidades no valor exportado e os novos vetores da nossa insero mundial. Na semana ada, Sidney Nakahodo e eu conclumos o estudo A nova dinmica das exportaes brasileiras: preos, quantidades e destinos (disponvel em www.iconebrasil.org.br), no qual procuramos traar uma radiografia da pauta comercial nos ltimos dez anos. Utilizando as classificaes de mercadorias da OCDE e da Unctad, dividimos a pauta exportadora em quatro categorias de produtos diferenciados - alta tecnologia (7% das exportaes), mdia-alta (25%), mdia-baixa (13%) e baixa tecnologia (8%) - e trs categorias de commodities: agronegcio (31%), minerais (10%) e combustveis (6%). Ao mesmo tempo, analisamos cinco regies como destino das exportaes: Amrica Latina (23%), Unio Europia (22%), EUA (20%), sia (15%) e outros (20%).
A pesquisa confirma que as exportaes brasileiras crescem puxadas mais pelas quantidades demandadas que pelos preos. Com exceo de uns poucos produtos de alta tecnologia, combustveis (petrleo, lcool e derivados), ferro e ao, em todos os demais segmentos o fator que melhor explica o crescimento do valor das exportaes so os volumes exportados, com uma clara diversificao em termos de produtos e destinos.
A anlise do destino das exportaes confirma antigas percepes dos estudiosos. Costuma-se dizer que o Brasil um "global trader" no comrcio internacional, j que nossa pauta relativamente bem distribuda em termos geogrficos. Porm, quando observamos o comportamento das sete categorias de produtos, vemos que o Brasil "global" apenas em commodities, que crescem em todas as direes, mas nos produtos diferenciados somos apenas um "regional trader".
Ocorre que, ao observarmos o conjunto da pauta exportadora, nossas exportaes mostram surpreendente dinamismo na direo da Amrica Latina e dos EUA. Nosso comrcio hemisfrico acumulava um dficit de US$ 4,2 bilhes com os pases americanos, em 1996. No ano ado atingimos um supervit de mais de US$ 25 bilhes. Todas as categorias de produtos crescem, mas chama a ateno o timo desempenho dos produtos diferenciados, que responderam por 87% do saldo positivo em 2005, com destaque para automveis, mquinas, celulares e aeronaves. J no caso da Europa, nossas exportaes mostram baixo dinamismo, com algum crescimento das exportaes do agronegcio, acompanhado de um dficit crnico nos produtos de maior tecnologia, que se mantm inalterado nos ltimos dez anos.
A mudana mais importante ocorre no padro de comrcio com a sia. Aqui, o crescente saldo comercial do agronegcio e dos minrios contrabalanado por dficits cada vez mais expressivos no grupo de produtos de alta e mdia-alta tecnologia. Os dados indicam que o dficit com os pases emergentes tende a crescer mais do que com o mundo desenvolvido, um fato que deveria servir para afastar o temor infundado de parte da indstria com a integrao com as Amricas e a Europa. A concorrncia da China tende a ser muito mais agressiva, para o Brasil, do que a dos EUA e da Unio Europia, aqui e l fora.
O resto do mundo tem menor importncia para o Pas, j que o grosso do comrcio se concentra em exportaes de commodities agropecurias e importaes de petrleo. Os embarques para a frica so irrisrios e o quadro dificilmente se vai alterar, a despeito da obstinao diplomtica com o comrcio com os pases mais pobres.
A concluso do estudo que a orientao prioritria da poltica comercial brasileira no deveria ser "Norte-Sul" ou "Sul-Sul", mas sim "Oeste-Oeste", qual seja, voltada para nossos vizinhos latinos e anglo-saxnicos. no chamado Hemisfrio Ocidental - que compreende as Amricas do Norte, Central e do Sul - que observamos o real dinamismo no comrcio exterior brasileiro, e no na velha dicotomia do planeta estabelecida no final da era colonial e que hoje perde completamente o sentido prtico.
Portanto, a anlise do saldo comercial brasileiro por destino confirma o acerto da poltica comercial da dcada ada, que priorizou a integrao dos 34 pases da rea de Livre Comrcio das Amricas (Alca), hoje moribunda. A falta de vontade poltica dos governos e as resistncias de certos grupos de interesse - indstrias protegidas, sindicatos, Igreja, grupos de esquerda e ambientalistas - jogaram uma p de cal no processo de integrao. O acordo da Alca morreu sem nunca ter nascido, no final de 2003, com mais de 7 mil colchetes ainda por serem retirados e uma ntida falta de liderana dos co-presidentes, EUA e Brasil.
A Alca foi substituda por uma dezena de acordos de pequena envergadura entre os EUA e pases pequenos da Costa do Pacfico e tambm por blocos regionais com um crescente risco de esfacelamento, como o Mercosul e a Comunidade Andina. Ao mesmo tempo, a diplomacia brasileira apostou numa integrao sul-americana que se mostra cada vez mais complicada, ante a ascenso de lderes com vises polticas opostas como Chvez, Morales e Kirchner, de um lado, e Bachelet, Uribe e Garca, do outro.
A prioridade central da poltica comercial deveria ser o comrcio. Muito poderia ser feito nesse sentido se os governos se preocuem um pouco menos com ideologias e novas geografias e um pouco mais com a melhoria do ambiente institucional para facilitar a vida das empresas.