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Iluso produtiva 47d3e

por Xico Graziano
12/09/2006 - 12:34
Maior assentamento rural do pas, a fazenda Itamaraty reflete a tragdia da reforma agrria brasileira. Milhares de famlias, subjugadas por lderes de araque, sofrem com a sorte. O sonho de Olacyr de Moraes se transforma em pesadelo. Localizada a 45 km de Ponta Por, MS, a enorme gleba, de 50 mil hectares, foi adquirida em 1973. Muito investimento e tecnologia geraram um projeto agropecurio exemplar. Seu proprietrio, nefito no ramo, virou rei da soja. Fama se une ao dinheiro. Tudo corria bem. Fortuna adquirida em contratos pblicos impulsionava o progresso no campo. Produo e trabalho brotavam da terra. Quase uma centena de pivs de irrigao, mais a pecuria integrada, movimentavam sete mil pessoas. Uma verdadeira cidade rural. O imprio agropastoril da Itamaraty comeou a ruir em 1995. M gesto se somou ao custo trazido pelo Plano Real. Com inflao galopante, a ciranda financeira remunerava mais que a produo. Estabilizada a economia, as dvidas se tornaram reais. Muita gente quebrou. Em 2001, o Incra adquiriu metade da fazenda Itamaraty, elaborando um projeto de assentamento para 1140 famlias. Em 2003, arrematou o restante, atendendo mais 1700 famlias de sem-terra. A transao, negociada, foi carssima, cerca de R$ 200 milhes. Tudo se justifica, todavia, em nome da reforma agrria. Elaborado pelo Idaterra, rgo do governo estadual, o plano de desenvolvimento do assentamento Itamaraty chega a emocionar seu leitor. Avanada agronomia se mistura com ideologia da libertao. Comea por citar Amartya Sen, Prmio Nobel de Economia: “desenvolvimento o aumento da capacidade de os indivduos fazerem escolhas”. Perfeito. Invasores de terras partiram para o “diagnstico participativo”. Ex-bias-frias e desempregados urbanos, gente excluda, so chamados a decidir sobre sua explorao agropecuria. Conforme se gaba no documento oficial, constroem juntos o conhecimento. bonito. Planeja-se tudo, desde a subsistncia familiar at a agro-industrializao local, incluindo a logstica. Mas a grande sacada reside na organizao do labor: implanta-se o trabalho coletivo. Nas reas comunitrias, irrigadas, se cultivar a solidariedade socialista. Ser? Como diria Joelmir Beting, na prtica a teoria outra. ados quatro anos de experincia concreta, quem visita o assentamento Itamaraty teme pelo futuro. Os nveis de produo so baixssimos, a qualidade de vida sofrvel. Campeia a prostituio e a corrupo. D pena de ver. Lotes so vendidos a cu aberto. No assentamento I, mais antigo, estima-se que 30% das terras j trocaram de dono. No assentamento II, recente, o comrcio fundirio se instala. Defronte a Sta Virgnia, a benesse custa R$ 15mil, com casa novinha em folha. Mais: quem comprar se habilita a receber, do Incra, novos crditos agrrios. De graa. Nada funciona, porm, sem a comisso do chefe. Sendo tudo irregular, a propina corre solta. Como e de mgica, autoridades pblicas no tomam conhecimento das transaes. Seguem o modelo do assentamento Dorcelina Folador, pioneiro na regio, onde metade dos lotes j se foi. Fulano do municpio de Dourados j comprou 8 lotes. Mas ningum sabe de nada. Pior a subservincia. Quase 11 mil pessoas encontram-se subordinadas a trs fortes organizaes polticas, MST, CUT e Fetagri. Estas se subdividem em dezenas de grupos polticos, arregimentando 30 a 50 famlias cada. Os articulados chefetes mandam a rodo. As assemblias decisrias envergonhariam o indiano Sen, idelogo do desenvolvimento com liberdade. A grande jogada econmica reside no arrendamento rural. O frgil sucesso do assentamento da Itamaraty depende de esquema de corrupo jamais visto na reforma agrria. Ocorre que as reas de explorao supostamente coletiva encontram-se cedidas para produtores da regio. Afirma-se por l que, dos 87 pivs de irrigao, cinco so conduzidos pelos prprios assentados. Os demais so explorados por forasteiros. Os agentes pblicos conhecem a maracutaia, mas entendem que, embora proibido, o arrendamento configura a melhor forma de assegurar renda para as famlias assentadas. Assim, ou fingem no ver ou participam do esquema financeiro. A renda paga diretamente ao chefe do grupo, que a reparte entre os apadrinhados. Parece diviso de furto. Soja, milho, algodo e mamona saem da Itamaraty como se gerados fossem pelo assentamento. Nessa iluso produtiva, a pecuria tambm encontra seu nicho. Por R$ 7 cabea/ms, alugam-se pastagens de capim braquiria. Preposto do frigorfico de Ponta Por, s ele, detm 800 bois na rea reformada. O socialismo agrrio se transforma em grossa picaretagem. A triste realidade se impe frente ao planejamento idealizado. H, sim, tentativas srias de aprimoramento tcnico. Curiosamente, todavia, uma Ong carioca venceu a licitao para fornecimento de assistncia agropecuria aos assentados. Na seqncia, fez uma triangulao financeira e reou a tarefa para quatro entidades locais ligadas CUT e MST. Tudo muito estranho. Quando o presidente Lula visitou o assentamento Itamaraty, em 2003, se entusiasmou e galgou uma colheitadeira. Feliz, iniciando o governo, afirmou que faria ali uma reforma agrria exemplar. A mquina que ele pilotou, entretanto, no pertencia aos assentados, mas sim aos forasteiros da malandragem. Ningum teve a coragem de contar ao Presidente. At hoje ele no sabe de nada.