Em tempos em que aloprados defendem a tese de que a reforma do Cdigo Florestal ampliar o risco de desastres em encostas, no muito inteligente colocar na parede quem est do lado dos no aloprados. No entanto, a proliferao de argumentos sem conhecimento de causa sobre o setor agrcola, infelizmente, tem que ver com um comodismo de dentro do setor.
O ministro Wagner Rossi adotou como discurso a modernizao do Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento (Mapa). Ainda cedo para tirar concluses sobre como essa modernizao ser feita, embora a indicao parea bastante razovel. Mas no cedo para identificar os desafios que o Mapa tem pela frente para se manter como o Ministrio que representa o setor produtivo agropecurio.
Enquanto no Mapa no houve desgaste poltico para a escolha do ministro, no Ministrio do Desenvolvimento Agrrio (MDA) a escolha foi marcada por disputa interna no PT. O Ministrio foi reduto dos representantes do Sul do Pas, onde nasceu o movimento da agricultura familiar, mas seu crescimento ou a interessar aos representantes do Nordeste, onde se concentra grande parte dos beneficirios dos programas do MDA. Ao contrrio do Mapa, o MDA objeto de disputa de poder poltico e, como ningum disputa poder poltico toa, fica claro que existe um descomo entre os dois Ministrios. Muito embora ambos, excluindo as polticas de reforma agrria, executem polticas de natureza similar, diferenciando-se apenas o pblico-alvo - todos os agricultores verdade, mas forosamente classificados em familiares e no familiares.
O primeiro ganha espao a olhos vistos, tendo sido capaz de implementar diversas novas polticas nos anos recentes. O segundo, com boas idias e tendo lanado um programa de seguro agrcola, que ainda muito pequeno, assiste a o primeiro tomar conta de reas que tradicionalmente eram suas. Na realidade, a poltica agrcola ainda responsabilidade do Mapa, mas o MDA vai dia a dia puxando a Poltica de Garantia de Preos Mnimos (PGPM) para o seu lado e com isso direciona a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) a executar cada vez mais polticas orientadas para os agricultores familiares.
Enquanto o oramento do Mapa (sem incluir Conab e Embrapa, que operam para os dois, e o Fundo de Defesa do Caf) cresceu 80% de 2004 a 2010, o do MDA (excluindo o Incra) cresceu 680%. Vale lembrar que o oramento do MDA ainda apenas 25% do Mapa. O oramento da Conab cresceu 180% (se fosse at 2009, o crescimento seria de 317%). Boa parte desse crescimento resulta das polticas de apoio aos agricultores familiares e abastecimento da populao pobre a partir de produtos comprados desses agricultores.
Agricultores familiares so agricultores como outros quaisquer e, no frigir dos ovos, o que interessa ter boas polticas para eles, independentemente do Ministrio. Mas no h dvida que o MDA est tomando espao em reas tradicionalmente do Mapa.
A meno neste artigo expanso do MDA no tem carter ideolgico. O MDA est crescendo legitimamente. Seus tcnicos souberam aproveitar as lacunas deixadas pelo Mapa em reas ligadas ao setor agrcola e no meio rural, mas que fugiam da expertise do Ministrio: polticas agrcolas e de crdito rural com foco em pblicos-alvo especficos, poltica de microcrdito para agricultores de baixa renda, polticas de distribuio de alimentos operadas em conjunto com outros Ministrios e polticas para pblicos do meio rural, antes negligenciados, entre outras. Mesclando polticas orientadas para o setor agrcola com as de cunho social - muito bem recebidas e alinhadas com dois mandatos de governo do PT, o MDA vem conseguindo crescer.
O recado deste artigo , na verdade, para o Mapa. A meu ver, o Ministrio tem algumas escolhas que deveria fazer imediatamente para retomar seu papel de liderana. A primeira buscar excelncia nas reas em que o Ministrio tem por funo atuar. o caso da defesa agropecuria e - por que no? - De puxar para si algumas funes da rea sanitria e inocuidade de alimentos, que esto em outros rgos do governo federal. Se operasse nessa rea com competncia, o Mapa garantiria seu papel de liderana, at porque ela traz consequncias para o desempenho exportador do setor agropecurio brasileiro. No entanto, atuando apenas nessa rea com competncia o Mapa se transformaria, no futuro, no Ministrio da Defesa e Sanidade Agropecuria. Parece-me pouco para o histrico do Mapa.
Na rea de poltica agrcola, caberia ao Ministrio batalhar pela unificao dos programas hoje executados em separado pelo Mapa e pelo MDA, mesmo que com algum custo poltico para o primeiro. O que no faz sentido dois Ministrios brigando por recursos para programas semelhantes s porque, supostamente, os instrumentos tm pblicos-alvo diferentes. No existe racionalidade alguma, exceto de ordem poltica, para que a PGPM seja executada por uma pasta (Mapa) e o Programa de Garantia de Preos para a Agricultura Familiar (PGPAF) esteja a cargo de outra (MDA).
Existem duas reas em que o Mapa precisa tomar uma deciso sobre que tipo de insero pretende ter (se que pretende ter alguma): polticas que promovam ganho de competitividade internacional para o setor produtivo - e aqui cabe a rea de relaes internacionais, j existente no Ministrio - e questes ambientais e de sustentabilidade relacionadas produo agrcola.
hora de o Mapa sair da defensiva no tema ambiental e puxar a responsabilidade para si. Tanto para fechar os espaos tomados pelos aloprados e mal-intencionados, quanto para dialogar com o setor produtivo sobre os avanos na rea ambiental que precisam ser feitos. Tirando o acrnimo, que no sairia amigvel, gosto da idia do Ministrio da Sanidade, Competitividade e Meio Ambiente para a Agropecuria.
Texto publicado no jornal O Estado de S. Paulo, em 19 de janeiro de 2011.