O banco central alemo conhecido por sua ortodoxia. Cachorro mordido por cobra tem medo de linguia. Aps a hiperinflao na Repblica de Weimar, os alemes aram a confiar mais no Bundesbank do que em Deus. Jamais ousariam brincar com a inflao novamente. E esta postura acabava expondo a fraqueza relativa dos vizinhos, com constantes desvalorizaes de suas moedas. At criarem o euro, um projeto poltico de unio que usaria a cartada blica como presso para a Alemanha ceder cada vez mais em sua ortodoxia monetria.
Com sua primeira grande crise, a Unio Europeia corre srios riscos de ruptura. De alguma forma, a Alemanha ter que bancar os custos dos resgates. Angela Merkel tem feito jogo duro at agora, o que coloca presso por reformas de austeridade nos pases perifricos. Mas o nvel de estresse tem atingido patamares alarmantes. Basta ver o que se a na Grcia. At quando a Alemanha consegue manter a firmeza para evitar o “moral hazard”? At quando os pases menos competitivos am politicamente as reformas necessrias? Os ttulos italianos j negociam acima de 6% ao ano, taxa insustentvel para um pas com 120% de dvida pblica sobre o PIB.
Eis onde entra o Banco Central Europeu. O BCE herdara a tradio do Bundesbank, condio para a Alemanha aceitar o euro. Mas, cada vez mais, o BCE se parece com o Federal Reserve americano. Ainda que de forma mais sigilosa, o fato que o BCE j abandonou sua ortodoxia faz tempo. Ele vem afrouxando sistematicamente suas exigncias para comprar ttulos soberanos dos pases mais endividados. ou a aceitar ttulos com “
rating” muito abaixo do usual. Expandiu seu balano, agora repleto de ttulos podres. E, finalmente, reduziu a taxa de juros na primeira reunio com o novo presidente, o italiano Mario Draghi. Como reao a estas medidas, dois alemes j renunciaram de seus postos no Bundesbank e BCE.
A presso para o BCE “abrir as pernas” enorme. O custo poltico de a Alemanha pagar diretamente pelos resgates alto demais. A sada pela expanso monetria muito tentadora. O jornal “O Globo” estampa no caderno de economia hoje a opinio do ex-ministro argentino Domingo Cavallo: “O euro precisa ser desvalorizado”. A revista britnica “The Economist” tem defendido uma atuao ainda mais ousada do BCE. Em suma, muita presso tem sido colocada no BCE para agir como “salvador da ptria” na regio. E seus atos recentes, ainda que na surdina, demonstram que ele vai capitular. Ser, ento, a morte definitiva do Bundesbank.
O professor de Harvard, Kenneth Rogoff, diz ser “misterioso” o valor relativamente robusto do euro atualmente. Tendo a concordar com ele. Quem ainda no viu o que est por trs do vu de respeitabilidade do BCE? Se olharem direito, vero que a mulher de Csar no mais honesta, ainda que tente manter as aparncias...

- Por Rodrigo Constantino, diretor do Instituto Liberal.