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Gesto territorial 1o5b35

por Xico Graziano
06/09/2012 - 16:54

Os ambientalistas querem aumentar as reas preservadas do pas. Indgenas lutam para demarcar mais terras exclusivas. Quilombolas tentam dominar seus espaos histricos. Agricultores precisam expandir a explorao do solo. E as cidades continuam crescendo. Haver como acomodar tantas demandas sobre o espao nacional? c1e19

Evaristo de Miranda, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria (Embrapa), estuda h anos a ocupao do territrio e o uso das terras no Brasil. Especialista em monitoramento sensorial por satlite, com doutorado em Ecologia na Frana, o renomado agrnomo comprova que anda sobrando pedido e faltando lugar para apaziguar tantos interesses. Mgica no resolve.

O resumo das informaes da Embrapa mostra sria problemtica. Ateno aos nmeros. Na atividade agropecuria, somando as pastagens e as lavouras, exploram-se 2,15 milhes de quilmetros quadrados, representando uma fatia de 25% do territrio nacional. Essa superfcie de produo, mantida nas propriedades rurais, pouco se tem alterado, conforme atestam os ltimos trs Censos Agropecurios do IBGE. Regra geral, as lavouras avanam sobre as pastagens extensivas, reduzindo-as, indicando intensificao no uso das terras. Eleva-se a produtividade por hectare ocupado. Boa agronomia, melhor zootecnia.

Expandem-se fortemente, por sua vez, as unidades de conservao ambiental. Os parques e reservas florestais constituem locais delimitados de preservao, mantidos sob responsabilidade do poder pblico. Geridos tanto pelo governo federal quanto pelos estados, eles abrangem 14% do territrio nacional. Acrescendo-se a eles os parques municipais e certos domnios preservados pelas Foras Armadas, a fatia estatal de proteo da biodiversidade beira os 17% do pas.

Identificadas e demarcadas, as terras indgenas ocupam 1,25 milho de quilmetros quadrados, notadamente distribudos pela Amaznia. Reservadas para o extrativismo dos arborcolas, essas imensas glebas recheadas de vegetao nativa representam prximo de 15% do Brasil. Adicionadas, as unidades de proteo da biodiversidade e as reservas indgenas, juntas, ocupam 32% do territrio nacional. Tal volume de terras ultraa o de qualquer outra nao, sendo de 10% a mdia mundial de reas protegidas.

Alm das reas pblicas, os estabelecimentos rurais declararam ao IBGE, por ocasio do ltimo Censo Agropecurio (2006), manter um total de 50 milhes de hectares formando suas reservas legais e suas reas de preservao permanente, localizadas dentro das propriedades. Isso significa que 5,9% do territrio nacional, apropriados por particulares, est sendo preservado para a fauna e a flora nativas, em especial nas faixas prximas dos cursos d gua. Matas ciliares.

Existem, ainda, os quilombolas. Asseguradas pela Constituio, as reas remanescentes de quilombos tm sido progressivamente tituladas, j atingindo cerca de 1% do pas. Por fim, as zonas urbanas expandem-se, por ora, sobre 0,25% do territrio. Considerando essas vrias situaes - agricultura, reservas florestais, indgenas, quilombolas e cidades -, chega-se ao ndice de 64% do territrio nacional que apresenta ocupao definida e restrita. Uai, diria o caboclo, cad o resto?

Embora o catastrofismo ecolgico leve a opinio pblica do Sul-Sudeste a imaginar o caos, excita a mente imaginar que um tero do territrio nacional ainda est praticamente desconhecido da sociedade. O incerto distribui-se, basicamente, nas imensas reas devolutas e nos alagados da regio Norte. Basta saber que o bioma da Amaznia representa, sozinho, metade do Brasil e se mantm intacto em 81,2% nos lugares inspitos, quase impenetrveis explorao humana. Floresta virgem.

Quer dizer, em pleno sculo 21 existem 36% do territrio nacional sem uso definido. E sobre essa fatia, principalmente, recaem todas as demandas contemporneas sobre a ocupao do territrio. Quais so elas?

Primeiro, a criao de novas unidades de proteo ambiental. Definidas pelo ministrio do Meio Ambiente, o mapa das reas prioritrias para conservao da biodiversidade sugerem, no mnimo, dobrar a salvaguarda ecolgica atual.

Segundo, as exigncias do Cdigo Florestal. Qualquer que seja o captulo final dessa longa novela, com certeza haver uma duplicao das zonas preservadas dentro das propriedades rurais, especialmente nas margens dos rios.

Terceiro, os reclamos dos indgenas e, quarto, dos quilombolas. No cessam os pedidos dessas populaes tradicionais, indicando que se avanar nas demarcaes existentes.

Quinto, resta a agricultura. Impelida pela demanda mundial de alimentos, e ada pela biotecnologia, mesmo ganhando produtividade a produo rural dever expandir as suas reas cultivadas e pastoreadas. Perderia o bonde da histria se o Brasil deixasse de aproveitar a chance de se tornar o celeiro do mundo.

Nas contas de Evaristo de Miranda, o somatrio das demandas pela ocupao e uso do territrio nacional, especialmente contando as limitaes ambientais, alcana 6,45 milhes km2. Isso representa quase 76% do territrio nacional. Concluso: inexiste possibilidade, fsica e geogrfica, de atender a todas as vontades expressas na sociedade. Como resolver os conflitos? Quem arbitra a disputa?

Sem estratgia definida pelo estado, a soluo depende do brilho na mdia e do jogo da poltica. Por enquanto, em face do preconceito urbano contra o ruralismo, quem est perdendo a agropecuria. A necessidade de sua expanso recebe sinais negativos da sociedade, que, ao contrrio, apoia que dela se subtraiam reas de produo. Periga encolher o campo.

Gesto territorial: eis um bom tema para o debate nacional.