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Acabou o Ministrio da Pesca e Aquicultura. Ainda bem. Irrelevante, servia de palco para negociatas polticas. Sua extino livrar o setor produtivo da tramoia. Ganhar o profissionalismo. Sorte dos verdadeiros pescadores e aquicultores do Brasil.
Foi Lula, em 2003, quem criou o esdrxulo Ministrio, entregando-o ao seu amigo petista Jos Fritsch, ento derrotado para o governo de Santa Catarina. O novo rgo permaneceu satisfazendo o PT catarinense at 2012, quando Dilma nomeou o Senador Crivella (PRB), bispo carioca da Igreja Universal, para comand-lo. Piada pronta: um pescador de almas no barco. Puro trambique.
Iniciado seu segundo governo, Dilma mexe nas redes: coloca Helder Barbalho (PMDB), recm derrotado para o governo do Par, para cuidar da pesca. Filho de Jader, a familiaridade do moo com a atividade era desconhecida. No fazia diferena. Importava, como nesses 12 anos de existncia, a acomodao poltica. De quebra, chaves da corrupo.
Enquanto os piscicultores do Brasil sofreram anos tentando conseguir autorizaes para uso de guas pblicas, duas falcatruas correram soltas no Ministrio da Pesca: a primeira, ligada s permisses para a pesca industrial, grandes barcos no mar. Todos sabiam que, h anos, rolava propina nessa matria, mas se calavam temerosos do poder. Coincidncia ou no, na semana ada a Polcia Federal desbaratou a quadrilha, chefiada pelo nmero dois do antigo Ministrio, Clemenson Pinheiro. Preso na operao Enredados juntamente com outras 18 pessoas, cobravam uma mdia de R$100 mil cada licena para pesca na costa brasileira. O esquema contava com a participao de servidores, armadores, representantes sindicais e intermedirios. Uma trama grada.
A segunda fraudese disfara com vestes sociais. Existe uma transferncia de dinheiro que o governo federal rea aos pescadores artesanais, para compensar sua perda de renda naquelas pocas do "defeso", quando o IBAMA probe a captura de certas espcies visando proteger a reproduo dos cardumes. Muito bem. Acontece que o combate da pobreza virou uma boca-livre para seduzir eleitorado. Segundo denunciou Marlos pyus, oCenso do IBGE (2010) encontrou 413.551 pescadoresem atividade no Brasil. Naquele ano, porm, o Ministrio da Pesca possua 853.231 mil pescadores, todos recebendo o "seguro-defeso", no valor de um salrio mnimo por ms, durante quatro meses. Somente em Braslia, onde no existe mar nem rio, existiam sete mil falsos "pescadores" recebendo o benefcio. Picaretagem da grossa.
Mais que a pesca, aaquiculturavem se destacando na agenda do futuro da alimentao humana. O motivo bvio: os cardumes naturais de peixes e crustceos se esgotam, mundialmente, devido presso exercida pela pesca tradicional, frente crescente demanda da populao. Produzir pescados em cativeiro, bem como reproduzir outros organismos de gua doce ou salgada, virou atividade promissora. Ampara-a o extraordinrio avano tecnolgico na nutrio e na gentica dos mesmos. Basta ver o delicioso, e relativamente barato, fil desaint peters, uma espcie de tilpia, na gndola dos supermercados. Ou o avermelhado salmo chileno.
Surgiram tambm as "fazendas" de camaro. Instaladas em manguezais ou regies lagunares prximas ao litoral, especialmente no Nordeste, acarcinocultura, como se denomina tal criao, ou a abastecer o mercado com o camaro "cinza", menos saboroso, porm bem mais barato que as espcies marinhas. Resultado: democratizou-se o consumo do camaro fresco. Dessa histria de sucesso tambm participam as algas, mexilhes, ostras. Sensacional.
Dados oficiais mostram que, da produo brasileira de pescado (2013), 38,4% j se originam da piscicultura. E, desta, grande parte (82%) se origina nas guas continentais, no nas marinhas. Em todo o mundo, a aquicultura responde por quase metade (48,9%) das carnes de pescado. A China responde, sozinha, por 62% da aquicultura mundial, seguida da ndia (6,3%). O Brasil, aps uma dcada de Ministrio, manteve seu distante 12 lugar no ranking mundial, com cerca de 1% da produo total.
Existe, sim, enorme potencial para crescimento da aquicultura nacional. A posio unnime entre os estudiosos do assunto, que defendem maior apoio ao setor, com novos marcos regulatrios, mais pesquisas e financiamento das atividades. Muita protena de excelente qualidade se esconde nessa virtuosa equao. Foi da que algum teve a ideia de criar um Ministrio. Lula a capturou para servir sua lgica poltica. Um desastre.
Nada comprova que a nova estrutura de gesto tenha influenciado a realidade produtiva. Durante sua existncia, planos maravilhosos foram lanados, em lindas cerimnias. Prometeram-se mundos e fundos. Mas a produo nacional de pescado cresceu, no perodo, abaixo de 2% ao ano. As importaes se elevaram. Cresceu, mesmo, o desperdcio de dinheiro pblico.
Fora o vexame internacional. Em 2014, aControladoria Geral da Unio (CGU) divulgou auditoria apontando uma srie de irregularidades na Pasta, incluindo a divulgao de dados falsos sobre a produo pesqueira e aqucola nacional. Informaes mentirosas foram encaminhadas para a FAO, Fundao das Naes Unidas para Agricultura e Alimentao, e para a Comisso Internacional para Conservao do Atum Atlntico (ICCAT). Vergonhoso.
Talvez agora, libertadas dos esquemas safados, a pesca e a aquicultura se expandam de verdade. Os brasileiros merecem. No apenas apreciar em sua mesa as delcias criadas nas guas, ou obtidas na pesca sustentvel, mas tambm viver longe desses peixes podres da poltica nacional.