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Conhea as estratgias de mercado de uma das maiores fazendas produtoras de leite no Brasil 6q532b

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02/06/2017 - 10:00

A Agrindus uma empresa agropecuria familiar fundada em 1945. Roberto Hugo Jank e seus dois filhos, Roberto Jank Jnior e Jorge Jank trabalham juntos, numa diviso de tarefas bastante eficaz. 3l6r6v

Atualmente so donos do maior rebanho holands registrado no Brasil. A Agrindus possui 1,7 mil vacas em lactao, e produo mdia diria de 60 mil litros de leite, que so processados e comercializados pela prpria fazenda atravs da marca LETTI. No total a fazenda possui um rebanho de 3,6 mil fmeas holandesas entre jovens e adultas, todas elas puras de origem, com pedigree na Associao Brasileira da Raa Holandesa.

A atividade ocupa atualmente 500 dos 2 mil hectares da Fazenda Santa Rita. A fazenda autossuficiente no fornecimento de alimentos para os animais, com rastreabilidade total sobre os processos produtivos, produo de alimentos e animais de reposio.

Scot Consultoria: Roberto, voc como produtor da Agrindus e como empresrio da Leite Letti, o que voc enxerga como as principais diferenas entre os desafios enfrentados pelo produtor de leite e pelo empresrio de laticnio?

Roberto Jank Junior: Como laticnio, ns trabalhamos no mercado de nicho, no o mercado de commodities. Nossa renda mais firme e mais estvel, com poucas variaes, mas somos muito dependentes de um trabalho de “formiguinha” porque no conseguimos ter uma penetrao muito ampla na grande mdia, bastante diferente o mercado de nicho e o mercado de commodities.

Como produtor, o grande desafio agregar valor no produto, por isso que a gente verticaliza, mas isso no facilita a vida da indstria porque a indstria tem que remunerar bem o leite, ento, o grande desafio do nosso laticnio remunerar o leite igual o mercado remunera um leite de qualidade. De fato, existe uma complementariedade, mas o desafio grande para o laticnio de conseguir remunerar na base do mercado. A grande vantagem que ns temos a da estabilidade de no termos altos e baixos.

Scot Consultoria: Voc acha que a verticalizao uma sada para o produtor, Roberto?

Roberto Jank Junior: Eu Acho que a verticalizao muito difcil, porque vender o produto no simples nem fcil e quando voc tem pouca escala mais difcil ainda. Somos uma indstria de alimentos perecveis e temos que fornecer o alimento fresco e de qualidade. uma operao cara que tem que ser dividida por escala.

Ento eu no acho que a verticalizao seja uma soluo para o pequeno e mdio produtor. Ela poderia ser uma tima soluo se fosse no formato de cooperativa, mas os exemplos que o Brasil teve no foram bons, so raros os bons exemplos. Mas eu continuo acreditando que o melhor formato de verticalizao o cooperativismo, falo isso tendo como referncia esse sistema em outros pases.

Scot Consultoria: O senhor acha que a composio do leite no Brasil ainda insatisfatria porque a maioria dos laticnios no paga a mais por isso ou os laticnios no precificam e por isso o leite no tem altos nveis de gordura, protena e lactose?

Roberto Jank Junior: Eu acho que o mercado ainda pouco profissional, os laticnios ainda no conseguem reconhecer o ganho de qualidade e eficincia na industrializao com slidos e alguns deles no tm foco nisso. Por exemplo, um laticnio de leite fluido que no faa padronizao do leite, no tem foco em slidos e o Brasil tem muitos exemplos disso. Mas em minha opinio o principal problema a falta de profissionalismo.

Eu no acho que o nosso leite tenha baixa qualidade, eu acho que o laticnio tem mais dificuldade de reconhecer e valorizar do que o produtor que tem que aumentar a quantidade de slidos. Agora o que falta de fato para melhorar esse profissionalismo uma finalizao, remunerar de forma diferenciada e mostrar para o produtor o que eles querem, seja volume, seja qualidade bacteriolgica, seja contagem de clulas somticas (CCS). Mostrar claramente que isso pode ser remunerado de uma forma diferente. Atualmente isso feito ainda de uma forma muito tmida pelos laticnios.

At mesmo os programas que j existem tem uma grande parcela no preo que no faz referncia a isso, que o que eles chamam de adicional de mercado, ou alguma variao que no est implcita o formato e o preo acaba sendo manipulado. Ou seja, mesmo quando existe o pagamento diferencial por qualidade, ele no muito relevante no preo.

O produtor precisa fazer conta, mas alterar principalmente o teor de slidos uma conta apertada hoje, levando em considerao o que as indstrias pagam pelo leite. A porcentagem de slidos no leite pode ser manipulada com dieta, manejo e gentica, mas o critrio precisa estar muito claro, at porque voc pode, inclusive, diminuir a produo quando aumenta o teor de slidos no leite. Por isso esse critrio mercadolgico precisa estar muito claro na cabea do produtor. Na parte microbiolgica, no que se refere a contagem de clulas somticas (CCS) e contagem bacteriana (CBT), eu acho que isso uma obrigao do produtor. Ele deveria seguir o padro mnimo de higiene sanitria e entregar um produto seguro e de qualidade nutricional para populao.

Scot Consultoria: Quais so as estratgias da Agrindus para minimizar os impactos dos aumentos dos custos de produo, principalmente com os alimentos concentrados?

Roberto Jank Junior: Ns produzimos 100% da forragem, mas ainda compramos as commodities de alimentos concentrado, como por exemplo, a polpa ctrica, o caroo de algodo e uma parte do milho. Nossa dieta baseada no custo mnimo, avaliamos o custo de energia e o custo de protena e fazemos a opo pelos ingredientes de maior custo-benefcio ao longo do ano. Alguns desses ingredientes ns estocamos, como o caso da polpa ctrica, caroo de algodo e milho. Trabalhamos com oportunidade de compra tanto no mercado fsico como no mercado futuro.

Scot Consultoria: Quais dicas o senhor pode dar para os produtores de leite que tem problemas com gesto e planejamento da fazenda?

Roberto Jank Junior: O leite uma atividade com muitos itens de controle. Tm muitos itens de procedimentos, itens de custo, itens de almoxarifado, no h como sobreviver nessa atividade sem um programa de gesto, um programa que possa te mostrar quais so seus gastos, qual sua receita e qual seu lucro.

muito importante que o produtor tenha metas de itens de custo, at quantos por cento do faturamento ele pode gastar com alimentao e fazer uma combinao disso com a eficincia alimentar para ter um critrio de produtividade ligado a um ndice econmico. Quanto o produtor pode gastar por mo de obra, fazer, por exemplo, uma meta de performance de litros de leite por funcionrio, uma meta de custos de medicamentos preventivos... As metas tm que ser adicionadas, acompanhadas e frequentemente avaliadas para o sucesso da fazenda.

Scot Consultoria: Como funciona o programa de bonificao da Agrindus, Roberto?

Roberto Jank Junior: Nosso programa de bonificao bem forte e estruturado, 50,0% do que o funcionrio recebe depende, por exemplo, do volume e da qualidade do leite. Fazemos a anlise diria no laticnio e a metade do salrio deles depende dessa anlise.

J os funcionrios que trabalham no setor de bezerras, por exemplo, recebem pela quantidade de animais desmamados, os funcionrios que trabalham na maternidade com as vacas no pr-parto recebem de acordo com a taxa de mortalidade e os funcionrios da agricultura dependem da produtividade agrcola, 100,0% dos meus funcionrios participam de algum programa de bonificao.

Scot Consultoria: Como o senhor v o mercado mundial em termos de demanda e oferta? H espao para o Brasil exportar leite? O senhor acha que a importao de produtos lcteos e a importao de leite em p sensibiliza um mercado que antes era equilibrado entre produtor e indstria?

Roberto Jank Junior: Eu acho que a questo do Brasil exclusivamente ligada a taxa de cmbio, o Brasil normalmente tem tido um real sobrevalorizado e a ele tira a competitividade. E toda vez que h uma pequena desvalorizao, como a que aconteceu ps-delao na semana do dia 17/5, o Brasil fica competitivo, mas na mdia o Brasil tem tido a moeda sobrevalorizada.

Claro que para exportao precisamos ganhar mais eficincia, mas depende mais da taxa de cmbio. A entrada de leite de fora depende tambm da taxa de cmbio interna. Agora por exemplo, com o preo internacional alto e o cmbio da forma que est, est entrando muito menos leite. Isso no uma questo de demanda interna, mas uma questo de taxa de cmbio.

Eu vejo que o Brasil tem espao. Eu acho que a Europa, sem as cotas, est cada vez com mais dificuldades para aumentar a produo de leite, a expectativa geral era de que a Europa aumentasse a produo, mas acredito que eles no tm competncia para trabalhar sem cotas e sem subsdios, ento eu creio que a medida com que os subsdios diminuam, a produo diminuir tambm.

A Argentina, Uruguai, Nova Zelndia e os Estados Unidos so os pases mais competitivos, mas eu acho que a insero ou no do Brasil est muito mais dependente da taxa de cmbio do que do comportamento da produo nos outros pases.

A nossa produo, por mais que tenha crescido de uma maneira muito expressiva nos ltimos 20 anos, ano ado provou que nossa produo atual no capaz de atender o mercado interno e o mercado externo, mas no momento que o consumo estacionar, acredito que o Brasil tenha excedente para exportar.

Eu acho que toda vez que tiverem oportunidade, por causa do cmbio, o mercado do leite vai importar. No tem muito a ver com a demanda, tem muito mais a ver com a oportunidade. Muitas vezes as indstrias preferiro comprar no porto a pagar mais caro na fazenda. E esse movimento que vai causar as depreciaes seguintes no preo, acarretadas por esse excesso de oferta. A indstria que compra prefere muito mais preo a qualquer outro fator que esteja relacionado com a cadeia de leite do Brasil.

A maioria das taxas de importaes satisfatria, mas acho que falta uma cota para o Uruguai, porque o grande volume de leite vem de l. Fala-se em triangulao via Uruguai, porque o Uruguai no teria o leite que est mandando para o Brasil. As cotas para a Argentina e para a Nova Zelndia foi um dos mecanismos mais saudveis colocados, melhor do que a taxa.

Para esse problema de excesso de importao, como no ano ado, que importamos quase um bilho de litros, importante dizer que o leite em p afeta, de uma forma importante, o mercado formal. Toda vez que afetamos esse mercado de forma deletria, temos um retrocesso no processo de profissionalizao do leite atravs do incentivo para o mercado informal. Temos que ter esse cuidado em um pas onde a taxa de cmbio no favorece a competitividade interna. Colocar cotas para o Uruguai e evitar a triangulao talvez seja uma das questes mais claras que temos para o mercado internacional do leite.

Scot Consultoria: Como o senhor acha que o mercado do leite ir se comportar esse ano? O pecuarista ter mais margem ou os preos continuaram mais justos?

Roberto Jank Junior: Acredito que teremos reduo de preo pela boa safra do Sul, fator que no aconteceu nos ltimos dois anos. Somasse isso ao momento de crise na qual o consumo est comprometido, mas por outro lado, como o preo dos alimentos concentrados est mais barato possvel que a margem seja parecida com a do ano ado. Teremos uma condio tendendo a estabilidade, mas com risco de termos uma sobre oferta de leite, algumas coisas podem contribuir para que isso no acontea, uma delas o preo internacional do leite, que talvez fique mais difcil de importar.

Scot Consultoria: Em sua opinio, quais so as grandes diferenas entre o produtor de leite e de carne? Porque a pecuria leiteira ainda vista como um empreendimento de baixa rentabilidade?

Roberto Jank Junior: No acho que o leite tenha baixa rentabilidade, acho que as pessoas ainda no tem horizonte para investir em pecuria de leite, que depende muito mais de imobilizao de capital do que a pecuria de corte.

Na pecuria de corte o boi um ativo de reserva de valor, ento quando a pessoa investe em gado, at em um momento de crise, uma forma de proteger o capital. No leite voc obrigado a investir para conseguir produzir, a voc engessa a operao dentro desse investimento, e o horizonte no muito claro para esse investimento. Ento o que eu acho que falta uma clareza no horizonte para que produtores mais profissionais invistam nessa atividade.

O leite tem essa imagem ruim porque o produtor mdio de subsistncia, familiar e sem escala, e esses so fatores importantes que a produo de leite deveria ter. Estamos melhorando, mas muito lentamente.