Um dos privilgios do meu trabalho a oportunidade de viajar e conhecer o “Brasil que d certo”. Essa semana estive no estado de Tocantins, participando de um dos mdulos de capacitao sobre sistemas integrados na cidade de Paraso do Tocantins, promovido pela Embrapa em parceria com o Instituto de Desenvolvimento Rural do Tocantins (Ruraltins). Esse treinamento envolve todas as variantes destes sistemas, ou seja, as integraes entre lavoura (L), pecuria (P) e floresta (F). Foi empolgante ver jovens tcnicos sedentos por informao e aprendizado para colocarem a mo na massa em vrias propriedades espalhadas pelo estado. 4x3z22
Tambm participei de um dia de campo em Buritirana, distrito de Palmas, dentro da programao do “Agosto Verde” promovido pela Secretaria de Desenvolvimento Rural (SEDER) da prefeitura de Palmas, em parceria com a Secretaria da Agricultura e Pecuria do Estado do Tocantins (SEAGRO) e com a Embrapa. O “Agosto Verde” procura divulgar alternativas que ajudem a uma melhor convivncia com a poca de seca na regio, que muito intensa e deixa a paisagem num quase monocromtico amarelo-palha, quebrado apenas pelas rvores do Cerrado e suas belas flores.
Nesta ltima, foi apresentado que o Tocantins teria potencial para implantar os sistemas integrados em 5,5 milhes de hectares, hoje ocupados por pastagens degradadas. A audincia, ento, foi questionada sobre quais seriam as dificuldades para adoo desses sistemas. Um dos produtores comentou que no teria como abrir mo de reas de seu plantio de soja para colocar os animais, pois na sua fazenda ou h solos para agricultura ou reas onde “nem trator-de-esteira anda...”.
A deciso dele bastante racional do ponto de vista econmico, especialmente considerando apenas o curto prazo. No longo prazo, o uso da agricultura solteira faz com que o teor de matria orgnica (MO) do solo decaia muito, ainda que isso possa ser contrabalanceado com o plantio direto, usualmente com braquiria ruziziensis como cobertura verde. A manuteno da MO do solo nas condies do Tocantins, onde a maior parte do estado tem uma seca muito prolongada e severa, deve fazer ainda mais diferena, uma vez que ela ajuda sobremaneira na capacidade do solo reter a umidade.
Alm da questo da menor rentabilidade da pecuria quando comparada agricultura, o produtor faria apenas se tivesse uma rea a mais, pois “no teria onde colocar os animais na poca da soja”, ou seja, a princpio ele s veria a possibilidade de entrar na atividade pecuria como proprietrio dos bovinos.
Nesse particular, meu colega Luiz Zago, pesquisador da Agropecuria Oeste, lembra que “para o agricultor iniciar o sistema ILP, a aquisio dos animais representaria 80% do investimentos necessrios. Quando o agricultor visa apenas da terminao de bois na entressafra da soja, a compra dos animais pode inviabilizar a engorda”. Ele apresenta a viso que no modelo de parceria, na qual o pecuarista pode se especializar na cria e recria e terceirizar a fase mais difcil, que a engorda.
Seja qual for o modelo, h uma excelente oportunidade de parceria.
O pecuarista teria um pasto safrinha para obter ganho com seus animais em plena seca. O agricultor, por sua vez, teria o mesmo benefcio se plantasse a forragem apenas como cobertura, mas gerando renda junto com o pecuarista. Mais do que s isso, ao plantar forrageiras mais produtivas, estaria aumentando a incorporao de MO ao solo de sua propriedade, pois, se h mais massa sobre o solo, haver mais razes a arem esse maior crescimento. H bons resultados na ILPF com as forrageiras Xaras, Piat, Paiagus e, a recm-lanada, Tamani.
Conforme meus colegas Cludio Frana e Deivison Santos, da Embrapa Pesca e Aquicultura, no Tocantins essas forrageiras seriam indicadas para sobressemeadura em menores percentuais de reas de soja. Eles comentam que j foram comprovados pela Embrapa excelentes resultados com os panicuns, Mombaa e Massai . Informam, ainda, que j esto previstos testes de novas cultivares, como o Zuri e o Qunia.
O pecuarista que conseguisse essa parceria teria ainda outra vantagem: uma vez que esses animais migram para a rea do parceiro agricultor, a lotao das pastagens reduzida, o que resulta em melhor desempenho dos animais que ficaram na sua fazenda. Isso tambm ajuda a evitar o superpastejo, favorecendo a longevidade das suas pastagens.
No caso do agricultor ter disponibilidade de algum resduo gerado na colheita, esse pode ser direcionado suplementao animal. Ainda que o pasto safrinha tenha excelente valor nutricional, o que possibilita bons ganhos mesmo com o uso de apenas suplementao mineral, uma suplementao mais intensa pode ajudar na obteno de um ganho maior por animal ou por rea. Maiores taxas de ganho favorecem a terminao dos animais, o que pode ser especialmente interessante em situaes de pasto safrinha, relacionado ao seu tempo de uso, como veremos mais a frente.
Se usados com cautela, resduos tm a vantagem de, pelo menor custo, mais facilmente propiciarem benefcio:custo positivo. Ao pensar em fornecer resduos aos animais, necessria uma boa avaliao sobre quo seguro seu uso, bem como fundamental enviar uma amostra representativa do lote para anlise em laboratrio. Essa a nica forma para conhecer seus valores nutricionais, uma vez que a caracterstica mais marcante de resduos, quaisquer que sejam, a variabilidade de sua composio.
No que tange a avaliao da segurana do uso de resduos, em geral, aguar nossos sentidos (viso, olfato e tato) suficiente para evitar o uso de lotes em condies suspeitas. Assim, ingredientes com cheiro de bolor, crescimento de fungos, cor alterada, etc. devem ser evitados, no importa o quanto seja tentador o seu uso.
As vantagens, de parte a parte, so incontestveis, mas ainda h dificuldade em se juntar os diferentes atores deste espetculo campeo de eficincia chamado de sistema integrado. Um dos fatores mais limitantes o rigor do perodo de uso, particularmente com relao data da sada. O plantio de nova safra tem que ser feito na oportunidade que reduza riscos, impreterivelmente! Isso implica que os animais tm que sair da rea, mesmo se o peso final (ou grau de terminao) pretendido na parceria no tiver sido atingido.
No so problemas incontornveis, porm, para que a parceria funcione, deve ficar muito claro para os envolvidos quais so as suas responsabilidades. Deve-se investir em uma cuidadosa combinao prvia que impea (ou iniba fortemente) quaisquer das partes de agirem em desacordo com o que foi em comum acordo contratado. Devem-se antecipar eventuais possveis problemas e estabelecer de antemo planos de contingncia. No caso citado dos animais ainda no terem sido terminados, envi-los para um Boitel at o abate, com a participao de cada um nos custos j definida, pode ser um exemplo de plano de contingncia.
Nas parcerias que tm sido feitas, existem todo tipo de combinao. Desde aquelas em que o pecuarista no recebe nada, mas se beneficia apenas em terminar o animal antes (recebendo as arrobas de entrada no pasto safrinha), at outras em que ele pagaria como se fossem “dirias” pelo uso do pasto safrinha.
Um desenvolvimento interessante para tentar ajudar a fomentar essa parceria entre agricultores e pecuaristas seria o desenvolvimento de planilhas que representassem os custos que cada um dos envolvidos tenha, agregado a um simulador de riscos (morte de animais, quebra de desempenho, etc.) e dos benefcios diretos, isto , os em que efetivamente haja faturamento.
Com dados claros e to fceis quanto possvel de serem interpretadas, estas planilhas poderiam ser uma importante ferramenta para facilitar o entendimento entre agricultores e pecuaristas. Ganharia cada um deles, o meio-ambiente e o pas, mais verde tanto pela forragem e culturas agrcolas mais vigorosas, como pelos dlares obtidos com a exportao de nossos excedentes de produo.
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[1] (Bortolon et al, dados no publicados)