44132d
Moro em Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul, h 15 anos e, das coisas da cidade que gosto, est o aeroporto. Para embarcar, com apenas alguns metros de caminhada, vencemos o caminho da entrada at o avio. Na volta, as malas chegam quase junto conosco na sala de embarque. At pouco tempo, porm, as malas iam para a esteira sem que a gente visse o trabalho das pessoas as retirando da carretinha. At que um dia, algum teve a iluminada ideia de quebrar as paredes e colocar vidros no lugar. Algum duvida que isso fez o pessoal ser mais “gentil” com as malas?
No tenho as estatsticas, mas bem capaz que essa modesta soluo tenha reduzido muito as reclamaes dos ageiros sobre malas danificadas. A transparncia do vidro garante que o trabalho seja fiscalizado pelos maiores interessados e que o provedor do servio fique sob esse escrutnio.
Essa situao remete a outra forma de transparncia bem conhecida: aquela plaquinha no restaurante escrito “VISITE NOSSA COZINHA”. Um fato engraado que raramente vejo algum aceitar o convite. Acho que, quanto mais a gente gosta do lugar, menos inclinados estamos a conhecer os bastidores. H sempre o risco de descobrir que ela pode ser suficientemente comprometedora a ponto de tirar mais um restaurante preferido da lista.
Se no primeiro exemplo, a transparncia resolveu um problema, no segundo, chama a ateno para o fato que ter a transparncia como aliada comercial implica em fazer muito bem o dever de casa. Manter uma cozinha funcionando a todo vapor e tinindo aos olhos dos curiosos um desafio a ser vencido com planejamento, trabalho e, acima de tudo, constncia.
Seria interessante saber quantas fazendas poderiam colocar, sem medo das crticas, uma placa semelhante, convidando os interessados a conhecerem suas instalaes e mtodos de trabalho. Pode parecer meio despropositada a comparao entre o restaurante e a fazenda, mas o fato que o consumidor, cada vez mais, quer informaes de onde vem sua comida e como ela produzida.
Parece ser uma boa ideia se adiantar a esta tendncia, preparando-se para poder ser “vistoriado”, no s para estar preparado com antecedncia, mas porque a movimentao para atingir o objetivo est alinhada com a adoo de procedimentos que ajudam a trabalhar melhor e ter melhor eficincia.
Dessa maneira, fazer o dever de casa na fazenda para poder dar transparncia a ela “sem medo de ser feliz” no seria exatamente um fim, mas a cereja do bolo, a coroao por um trabalho de organizao e ganho de eficincia.
Ainda que no o fim em si mesmo, ter orgulho de mostrar a fazenda por seguir boas prticas de produo pode ser usado como o indicador do sucesso na organizao e motivo para manter os processos afiados.
Coletivamente, a vantagem para que haja um movimento de muitos produtores a atingirem essa condio que o setor constantemente bombardeado por inmeros lados sejam ambientalistas, protetores dos direitos animais, vegetarianos, etc. Recentemente, dois programas da TV fechada colocaram a pecuria como vil, um dos quais s tomei conhecimento por conta da reao de colegas do setor.
Quando esses ataques acontecem, comum haver algum revide e uma cobrana para respostas to duras quanto possvel. Ainda que seja difcil ignorar esses ataques, preciso refletir se partir para a briga realmente a estratgia mais inteligente.
O primeiro ponto a se considerar que muitas vezes o pblico para quem se destina a mensagem original j tem opinio formada e, por mais que sejam usados nossos melhores argumentos para rebat-la, prevalecer a ideia, na melhor das hipteses, que os dados positivos que falamos da exceo e no a regra. Na pior das hipteses, que nada que falamos verdade.
O segundo ponto que nestas situaes comum prevalecer a resposta dada com o “fgado” e no com o “crebro”, o que aumenta a animosidade da situao e pode piorar ainda mais a viso da sociedade sobre o setor. Neste particular, ajuda muito exercer a empatia, ou seja, colocar-se no lugar do outro. Uma pessoa que contra a pecuria por ser contra a morte de animais age assim pelo bom princpio de se preocupar com o sofrimento de outro ser vivo. Por mais que eu no concorde com ela, afinal, animais de criao existem como fim de alimentar as pessoas e no os matamos por crueldade, sua posio deve ser respeitada. Ao me esforar para tentar ver o mundo com os olhos dela, sou muito mais capaz de estabelecer um dilogo que nos traga a um ponto de convivncia pacfica ou, at, convenc-la que ela pode continuar sensvel ao sofrimento animal e comer carne.
Por fim, e o mais importante, que ao respondermos estamos dando eco e, portanto, ampliando a mensagem negativa, fazendo-a a alcanar ainda mais pessoas, sendo a maioria desconhecedora da realidade do campo e provavelmente tambm com ideias pr-formadas. No final das contas, as pessoas que acabam gostando das respostas dadas neste caso so pessoas ligadas ao setor, naquela situao intil de “pregar para convertidos!”
De forma alguma, contudo, devemos ficar inertes aos ataques. A melhor alternativa, ento, no perder oportunidade para divulgar notcias positivas do setor e, dentro de cada unidade produtiva, tentar aplicar as melhores prticas produtivas, procurando o trip da sustentabilidade: (1) ser economicamente vivel, (2) socialmente justa e (3) ambientalmente correta.
Programas, como o Boas Prticas Agropecurias - Bovinos de Corte, esto disponveis para ajudar o pecuarista a trilhar esse caminho. Sendo bem-sucedido em sua adoo, ajuda a melhorar vrios aspectos das propriedades e permite com que seja possvel a colocao da placa “Visite a nossa fazenda” e esperar, com orgulho, que algum aceite o convite.
Podemos e devemos manter uma agenda positiva da pecuria, cantando em prosa e verso nossos feitos, a importncia do setor para economia do pas, os milhes de empregos, a produo feita predominantemente de forma mais natural em pastagens e a oferta de protena de alto valor biolgico vel populao. Nada melhor, porm, do que poder abrir as portas para quem quiser ver. Contra a maledicncia, nenhum antdoto mais poderoso que a transparncia!