por joo de almeida sampaio filho*
No momento histrico em que o Brasil assumiu a liderana mundial em volume exportado de carne bovina, o pecuarista ou a sofrer como nunca a queda da sua renda. um quadro no mnimo paradoxal j que a lgica faria crer que o produtor tambm estivesse com o caixa em dia. Mas isto no acontece.
Em 2005, o pas exportou US$3,15 bilhes de carne bovina crescendo 22,4% frente os US$2,57 bilhes do ano anterior. Em volume, as vendas chegaram a 2,2 milhes de toneladas, elevao de 18,5% sobre o total de 1,8 milho de toneladas registrado em 2004. Para este ano, a expectativa que as exportaes brasileiras de carne bovina cresam cerca de 10% em volume e 15% em faturamento.
Este crescimento est relacionado com o fim gradativo dos embargos carne ocasionados pela febre aftosa e pelas previses de estoques internacionais mais enxutos. Porm este cenrio positivo no chega ao bolso dos pecuaristas, que vm sofrendo com aumento de custos, recuo no valor da arroba e cmbio desfavorvel. Os custos subiram com o aumento dos insumos, dos derivados do ao, dos combustveis e lubrificantes e tambm com o aumento do frete.
A arroba cai porque o preo da commodity tende a recuar ao longo dos anos, com a rentabilidade sendo progressivamente transferida para produtos de maior valor adicionado. Isto coloca o pecuarista num crculo vicioso – precisa investir em ganhos de escala para conseguir melhorar margens, mas ao elevar a produtividade provoca superoferta de gado, o que acaba pressionando a cotao da arroba para baixo.
Para se ter idia do prejuzo do pecuarista, no ano ado, os Custos Operacionais Totais (COT) da pecuria de corte subiram 6,41%, enquanto o preo pago pelo boi gordo caiu 11,91%. Os dados so de estudo do CEPEA/CNA.
A perda fez aumentar o abate de matrizes para gerar renda, o que pode comprometer futuramente a oferta de bezerros. No primeiro semestre de 2005 o ndice de abate de fmeas chegou a quase 50% em algumas regies produtoras. E a arroba em So Paulo registrou em janeiro deste ano a pior cotao das ltimas trs dcadas ficando em torno de R$50,00.
Podemos observar que a cadeia produtiva da pecuria vive contrastes. Quem vende carne sorri, mas quem vende boi chora. Falta homogeneidade e transparncia aos negcios do setor. A pecuria tem que produzir resultados, renda e mercado para todos (pecuaristas, frigorficos e varejistas).
Apesar de ser o alicerce da cadeia pecuria o produtor sofre por ser o elo mais frgil. J os frigorficos e varejistas tm fortes indcios de oligoplios, o que lhes d um elevado poder de barganha frente aos produtores.
Dados da Scot Consultoria mostram que as trs maiores redes varejistas respondem por 35% a 40% das vendas de carne. E que dos cerca de 1,6 mil frigorficos com algum tipo de inspeo, somente 18 respondem por 98% das vendas externas. Desses os cinco maiores detm 65% das exportaes e apenas dois controlam cerca de 40% dos embarques brasileiros de carne bovina.
O debate de algumas propostas pode ser salutar para encontrarmos solues que recuperem de modo sustentvel a renda do pecuarista. Primeiro precisamos pensar em formas mais modernas de comercializao, que distribuam melhor a renda em toda cadeia.
A pecuria evoluiu tecnologicamente fazendo o setor crescer em produtividade e qualidade. Mas, o modelo de compra e venda o mesmo de 50 anos atrs. Exemplo disso que o produtor vende arroba e o consumidor compra quilos. Parmetros diferentes entre matria-prima e produto final provocam distores.
O produtor quando vende o boi deve receber por tudo que vende, no apenas por uma parte. preciso encontrar um formato que apure melhor o valor quantitativo e qualitativo do boi. Isso pode levar a uma remunerao mais adequada da realidade do que est sendo vendido.
Existem experincias que podem ser aprimoradas e sirvam de embrio para um modelo mais eficiente de comercializao. Alm disso, a criao de balanas comunitrias e pblicas, ligadas a entidades ou associaes pode fortalecer a confiabilidade no processo de apurao do peso do boi.
O atual tamanho do rebanho nacional mostra que o pecuarista est produzindo para participar e no para ganhar. Talvez seja o momento de produzir menos para adequarmos a oferta demanda. Entretanto, ao produzir menos o pecuarista a a correr o risco de ser desapropriado por falta de produtividade.
Temos assim um claro exemplo de como a legislao inimiga de uma moderna gesto de negcios que leve em conta os ajustes sazonais e necessrios dos mercados.
Em termos de desafios globais, a cadeia produtiva da pecuria tambm precisa atuar em outras frentes, alm da harmonizao da corrente comercial interna, para trilhar o caminho do desenvolvimento sustentvel:
# Erradicar a aftosa e outras doenas no mbito continental;
# Simplificar a carga tributria;
# Adequar a rastreabilidade realidade do pecuarista e s exigncias do mercado consumidor;
# Investir em comunicao institucional para consolidarmos a imagem de atividade responsvel scio-ambiental e refutarmos veementemente a equivocada impresso que a pecuria cresce custa de desmatamento da Amaznia e do trabalho escravo;
# Fomentar o consumo interno investindo fortemente em MARCAS de carne.
* joo de almeida sampaio filho, economista, presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB)