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Do combate à prevenção: nova legislação e decisão do STF exigem ação imediata do produtor rural contra incêndios 5g2wu

por: Pedro Puttini Mendes 5ki59

Segunda-feira, 5 de maio de 2025 - 06h00

Foto: Freepik 2r5i4n


Com o agravamento das mudanças climáticas e o aumento expressivo dos focos de incêndio em regiões sensíveis como o Pantanal e o Cerrado, o Brasil tem ado por uma transformação profunda em sua legislação ambiental. 

A resposta do Estado tem sido clara: endurecer regras, ampliar sanções e exigir dos produtores rurais uma atuação cada vez mais ativa na prevenção de riscos ambientais.

Um marco recente dessa mudança foi a criação da Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, sancionada pelo presidente da República em 31 de julho de 2024, em Corumbá-MS, por meio da Lei nº 14.944/2024. 

A nova lei estabeleceu diretrizes nacionais para o controle do uso do fogo em áreas naturais e produtivas, promovendo uma gestão de risco integrada entre União, estados, municípios e o setor privado.

A mudança de paradigma é evidente: o fogo deixa de ser tratado como um problema reativo e a a ser abordado como um fenômeno ambiental previsível e gerenciável, cuja prevenção deve ser planejada e compartilhada entre todos os agentes envolvidos.

Prevenir deixou de ser recomendação: virou dever legal 2n1w2v

Logo após a sanção da lei, vieram regulamentações ainda mais rígidas. O Decreto Federal nº 12.189/2024, de setembro, ampliou significativamente as penalidades para incêndios em vegetação nativa, prevendo multas que podem ultraar R$ 10 milhões.

Mais importante: o decreto ou a punir também a omissão, responsabilizando os proprietários que não implementarem medidas de prevenção, como aceiros, brigadas de incêndio e planos de resposta.

Esse entendimento foi reforçado pela publicação da Medida Provisória nº 1.276/2024, em novembro, que promoveu ajustes pontuais, mas decisivos, na Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo. 

Um dos principais avanços foi a inclusão do artigo 46-A, que deixou absolutamente claro que a ocorrência de incêndio em vegetação nativa não altera o status jurídico de proteção da área.

Em outras palavras, se uma floresta ou mesmo uma pastagem nativa for atingida pelo fogo - independentemente da culpa ou da origem do incêndio - a área continua protegida ambientalmente por lei. 

Essa medida vem combater informações equivocadas que circularam em épocas de queimada, alegando que bastaria incendiar para, em seguida, liberar a área para atividade agropecuária. A nova redação legal afasta de forma definitiva esse entendimento.

A MP também autoriza o Fundo Nacional do Meio Ambiente a destinar recursos para ações de prevenção e combate a incêndios florestais e reforça a exigência de que todas as propriedades rurais mantenham planos de prevenção e controle de incêndios atualizados.

Estados adotam medidas próprias: o caso de Mato Grosso do Sul 6m152e

Com base nesse novo arcabouço legal, estados também começaram a adotar medidas próprias. Em 27 de março de 2025, o Governo de Mato Grosso do Sul decretou, por meio do Decreto “E” nº 10, o estado de emergência ambiental por 180 dias em todo o território estadual, com foco no Pantanal. 

A medida antecipa-se ao período crítico de estiagem e determina a adoção obrigatória de medidas preventivas, como:

Construção de aceiros com largura mínima de 50 metros ao longo de estradas e pontes (art. 6º);

Autorização para aceiros de até 50 metros em divisas entre propriedades, desde que cumpridos critérios técnicos e obtenção de licenças ambientais (art. 7º);

Proibição de queimadas controladas durante o período da emergência.

Essas medidas têm respaldo técnico e jurídico em normas estaduais anteriores, como o Decreto nº 15.654/2021 e a Norma Técnica nº 45/2021 do CBMMS, mas ganham agora um novo peso diante do cenário climático e normativo.

Ibama inicia notificações formais aos produtores 4q29k

Complementando esse esforço, o IBAMA publicou o Edital de Notificação nº 24/2025, no Diário Oficial da União de 30 de abril. A notificação listou centenas de propriedades rurais, principalmente em Corumbá-MS, informando nominalmente os proprietários, nomes das fazendas e inscrições no Cadastro Ambiental Rural (CAR), com o objetivo de formalizar o dever de prevenção individual.

Com base em dados de satélite e cruzamento de informações fundiárias, a notificação avisa: a omissão de conduta preventiva poderá gerar autuação imediata, sem necessidade de ocorrência prévia de incêndio. Ou seja, não é mais o dano que ativa a sanção - é a ausência de ação preventiva.

Os proprietários notificados devem cumprir obrigações como:

Construção e manutenção de aceiros estratégicos;

Formação e capacitação de brigadas de incêndio;

Aquisição de equipamentos de combate a incêndio (abafadores, EPIs, etc.);

Monitoramento contínuo da área e cooperação entre vizinhos.

STF impõe penalidade máxima: desapropriação

Se o Executivo e o Legislativo já vinham avançando na responsabilização ambiental, o Judiciário agora deu um o além, com uma decisão inédita e polêmica do Supremo Tribunal Federal (STF).

Em decisão recente, o STF determinou que a União deve desapropriar imóveis rurais degradados por desmatamento ilegal ou incêndios criminosos, retirando a posse de quem descumpriu a função social da terra. A ideia é que essas áreas sejam destinadas à reforma agrária ou projetos de recuperação ambiental.

Embora o impacto simbólico da medida seja significativo, é necessário fazer uma crítica responsável e técnica: não há hoje qualquer regulamentação que permita aplicar esse tipo de desapropriação de forma segura e objetiva.

O voto do relator, ministro Flávio Dino, avança para além do texto constitucional ao sugerir uma modalidade de desapropriação punitiva sem lei específica que discipline seus critérios, procedimentos e garantias. 

Isso transfere para o Poder Executivo a tarefa de interpretar e aplicar uma decisão sem amparo legal claro, abrindo margem para insegurança jurídica, conflitos fundiários e arbitrariedades.

A decisão ainda ignora variáveis essenciais, como: Ocupações de má-fé por terceiros; Falhas do Estado na fiscalização prévia; Ausência de perícias técnicas conclusivas; Casos de regeneração ambiental possível e documentada.

Sem regulamentação, esse tipo de medida corre o risco de atingir pequenos produtores e comunidades tradicionais, que podem ser penalizados injustamente, enquanto os verdadeiros causadores do dano escapam da responsabilização adequada. 

É uma medida com aparência de rigor, mas com eficácia limitada e potencial discriminatório, que fragiliza o Estado de Direito no campo.

O que fazer: prevenção é o único caminho 3h3b9

Diante dessa nova realidade - normas mais duras, fiscalização ativa, decisões judiciais de efeito direto sobre a posse - o produtor rural precisa atuar com planejamento, técnica e documentação.

As principais ações recomendadas são:

Mapeamento das áreas de maior risco com uso de drones, imagens de satélite e sensoriamento remoto;

Implantação de aceiros técnicos e autorizados, mantidos ao longo do ano;

Plano de Prevenção e Combate a Incêndios, com treinamento de equipe e protocolos de resposta rápida;

Monitoramento contínuo da propriedade, com registros fotográficos, relatórios e laudos técnicos;

Documentação de todas as ações preventivas, demonstrando diligência e boa-fé em fiscalizações e disputas legais.

Investir em prevenção é muito mais barato - e seguro - do que enfrentar multas, embargos, ações civis públicas, indenizações ou, agora, a perda da terra por decisão judicial.

Por fim, vale comentar o projeto Fazenda Mais Segura que surge como uma iniciativa estratégica para orientar produtores rurais na adoção de práticas preventivas, gestão de risco ambiental e proteção jurídica do patrimônio rural. 

Com foco em soluções práticas e linguagem ível, o projeto disponibiliza gratuitamente um eBook que reúne orientações técnicas, modelos de plano de prevenção, orientações sobre aceiros, documentação e preparação de brigadas. 

O material é indicado para produtores, técnicos, advogados e gestores do setor rural e pode ser ado em: https://grupoproducaocoletiva.rds.land/programa-fazenda-mais-segura-fazenda-mais-verde


Pedro Puttini Mendes 33a4e

Advogado (OAB/MS 16.518, OAB/SC 57.644) e Professor em Direito Agrário, Ambiental e Imobiliário. Comentarista de Direito Agrário para o Canal Rural. Organizador e coautor de livros em direito agrário, ambiental e aplicado ao agronegócio. É membro fundador da União Brasileira da Advocacia Ambiental (UBAA) e membro das comissões de Direito Ambiental e Direito Agrário da OAB/SC. Foi Presidente da Comissão de Assuntos Agrários e Agronegócio da OAB/MS e membro da Comissão do Meio Ambiente da OAB/MS entre 2013/2015. Doutorando em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Socioambiental pela Universidade do Estado de Santa Catarina, Mestre em Desenvolvimento Local (2019) e Graduado em Direito (2008) pela Universidade Católica Dom Bosco.

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